Lembro-me de quando conheci o produtor português Luís Pato, no Tour Mistral 2007, em Brasília. Eu estava resfriada e, por isso, não conseguia sentir aromas nem sabor. Mesmo assim, ele teve toda a paciência de me apresentar cada um dos vinhos que estavam expostos em sua mesa e de me explicar coisas sobre a Bairrada, a região a qual ele pertence.
Saí de lá encantada pela paixão que ele nutre pela uva Baga e outras castas autóctones dessa região que o viu nascer. E, claro, fiquei rezando para que ele voltasse logo ao Brasil e que, nessa ocasião, eu estivesse com olfato e paladar apurados para não perder nenhum detalhe. Outras oportunidades vieram, e cada vez eu me torno mais sua fã. Gosto da sua inquietude e criatividade.
Nesta semana, pude reencontrá-lo novamente e conhecer produtos ainda inéditos para mim. Mas, antes de falar deles, Pato me contou sobre o Fernão Pires Tinto 2012. Aí você, que entende de vinho português e sabe que Fernão Pires é uma uva branca, deve estar se perguntando: “Como assim um vinho tinto de uva branca?”.
Daí eu respondo que esse é o primeiro tinto de branco já feito no mundo. Pato o idealizou para homenagear o nascimento do neto, que se chama Fernão. Por isso, o rótulo é ilustrado pela mão de Pato e do bebê, em faz alusão à Criação de Adão, famosa obra de Michelangelo.
Para dar a cor ao vinho, utilizou 6% de uvas Baga que fermentaram junto ao mosto por 10 dias em pequenos lagares de plástico. Genial! Esse não fez parte da degustação, mas assim que prová-lo, conto aqui o que achei.
NOTA: É comum encontrarmos vinhos brancos de uvas tintas. Nesse caso, as uvas são esmagadas e se separa as cascas do mosto para a fermentação. Assim, o líquido não é tingido pela pele da uvas.
Se para tingir uma branca, a Baga se mostrou muito eficiente, imaginem como protagonista. Pato diz que ela é prima da Nebbiolo (que compõem os italianos da região de Barolo) e da Pinot Noir, uva clássica da Borgonha. E por conta de sua versatilidade, é completamente compreesível a paixão do enólogo por ela.
Espumante Baga Rosado Brut (R$ 112)
Pude provar o espumante Brut Rosé, elaborado somente com essa casta. As uvas foram prensadas levemente a vácuo, com primeira fermentação em cubas de inox e a segunda, em garrafa. É fresco, leve e acompanhou muito bem uma salada de lulas com feijão canapu do chef Francisco Ansiliero.
Pato Rebel 2010 (R$ 156)
E a surpresa desse rótulo que mostra a irreverência de Pato, influenciado por imagens clássicas de Einstein e Mick Jagger? Chamado de Rebel, esse vinho tem 90% de Baga, 9% de Touriga Nacional e 1% de Bical. A acidez, o corpo e os taninos macios casaram muito bem com o corte de cordeiro, acompanhado por nhoque de mangaritos e manteiga de sálvia. É um vinho leve, com apenas 12,1% de teor alcoólico e que tem aromas de frutas vermelhas e um toque de chocolate.Experimentamos também o Vinha Barrosa 2010, que eu adorei (mas esqueci de tirar a foto). Esse vinho é sensacional e está pronto para o consumo, embora tenha um poder de envelhecimento de mais 15 anos pelo menos. É fruto de vinhas velhas, com mais de 90 anos, e passa por estágio de 12 meses em barris novos e usados de carvalho francês.
Abafado Molecular Rosado 2009
Já o vinho de sobremesa Abafado Molecular é 100% Baga e elaborado por método que interrrompe a fermentação por congelamento para preservar o açúcar residual do líquido. A cor é meio alaranjada, o aroma lembra marmelada e a acidez quebra um pouco o caráter doce. Foi muito bem com a torta de castanha do Pará escoltada por sorvete de creme.
Também provamos o Vinhas Velhas Branco 2013 (R$ 103), que reúne as castas Bical (50%), Cerceal e Sercialinho fermentadas por cera de 4 meses em inox. Essa última é produzida somente por Luís Pato, que herdou as parreiras do pai. “É um clone de Cerceal e Alvarinho, outra casta típica de Portugal. Muitos produtores tentaram plantá-la à época, mas somente nós conseguimos ter sucesso por conta do manejo. Tínhamos 1,5 hectares e conseguimos plantar mais. Hoje são 3,5 hectares”, contou o produtor. O vinho é fresco, embora encorpado. E precisa de uma decantação rápida para abrir os aromas cítricos.
O infante do Cerraro e o da Bairrada
Para finalizar, fica a lembrança desse encontro, que rezo para ser repetido muitas vezes. Porque, para mim, é sempre muito bom estar com pessoas inteligentes, inquietas e irreverentes.
Os vinhos podem ser encontrados na Mistral, SHIS QI 9 Conjunto 17, Lago Sul.
Telefone: (61) 3701-1000
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